segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

RISCO SOBERANO E PRÊMIO DE RISCO EM ECONOMIAS EMERGENTES.



Em geral as transações financeiras são marcadas por assimetria informacional entre os agentes superavitários e deficitários. Sob o ponto de vista dos credores a assimetria afeta o prêmio pelos riscos de crédito em qualquer operação e aquisição (crédito e títulos financeiros). O desenvolvimento das transações financeiras acontece quando se fazem possíveis meios para reduzir o peso negativo das assimetrias de informação: coleta e processamento de informações antes das operações; firmação de contratos e monitoramento de sua execução de modo a controlar o uso dos recursos após o repasse; estabelecimento de garantias de modo a minimizar as perdas em caso de inadimplência ou falência do devedor e, assim, elevar a disposição a pagar por parte desse devedor etc. Contudo, tais mecanismos operam com custos e nem sempre com eficácia suficiente para contornar o problema.


A inexistência de instrumentos legais-judiciários ou institucionais que protege o cumprimento de contratos e o exercício de garantias, a assimetria de informações e os prêmios cobrados como compensação pelos riscos de crédito encarecem e inviabilizam a existência de transações financeiras. A presença de agências ratings em qualquer economia, constitui um elemento essencial para a oferta de recursos financeiros, não se restringindo apenas a bancos. Instituições com competência em coleta de dados e processamento de informações sobre a qualidade de seus clientes, devido a sua proximidade com estes. O caráter impessoal das relações entre aplicadores e captadores das operações bancárias, supõe-se a disponibilidade dos serviços de rating para o desenvolvimento de tais mercados.

Seguindo este contexto, um risco em particular é o risco soberano (risco de crédito associado a operações de crédito concedido a Estados soberanos). A garantias e monitoramento do cumprimento de contratos adquirem, características distintas daquelas presentes nos casos de crédito para agentes privados ou mesmo de setores públicos infra-nacionais e não-soberanos. A capacidade de pagamento reporta-se a variáveis macroeconômicas como reservas de divisas e fluxos no balanço de pagamentos, crescimento econômico e capacidade de arrecadação tributária, fatores políticos entre outros. Quando se trata de risco-soberano as agências rating, buscam analisar e avaliar a capacidade e a disposição de um governo cumprir integralmente a sua dívida nos prazos e condições acordados com os credores da contratação do empréstimo. O resultado da avaliação sintetiza uma classificação, ou seja, a probabilidade de um determinado Governo decretar moratória (suspensão do pagamento dos juros ou principal da dívida na data de seu vencimento ou reestruturação “involuntária”).

Note que essas classificações soberanas referem-se à capacidade e disposição do Governo central honrar suas dívidas com credores privados. Cada agência possui sua própria ciência de classificação, o que dificulta a interpretação e comparação. Em geral, as classificações são variações da escala A, B, C, D. As principais agências de classificação de riscos de crédito Moody’s, Standard & Poor’s (S&P) e Fitch – classificam tanto um devedor, quanto uma emissão específica. Segundo a escala da S&P e da Fitch, a melhor classificação é “AAA” e a pior “D”. Já na escala da Moody’s, a melhor classificação é “Aaa” e a pior “C”. Ou seja, quanto pior a classificação, maior é a probabilidade de moratória e vice-versa. Os governos classificados acima de “BBB-” ou “Baa3” são chamados de “grau de investimento”, enquanto os classificados abaixo são chamados de “grau de especulação”. Para efeitos de diferenciação numa mesma categoria, a S&P e a Fitch adotam sinais aritméticos (+ e –) e a Moody’s números (1, 2 e 3). As categorias mais elevadas (AAA e Aaa) e as mais baixas (CC, Ca, ou abaixo), não possuem tais símbolos de diferenciação.

Para cada governo avaliado, as agências comentam suas opiniões sobre a provável direção de risco no médio prazo (um a três anos), chamado de perspectiva “Outlook”, positiva, negativa, estável e em desenvolvimento. Mas quando surgem mudança na classificação de um soberano, os rating apresentam uma listagem à parte. Por exemplo, a Moody’s chama de “lista de aviso”(Watchlist) – direção da classificação nos próximos 90 dias (revisão upgrade, downgrade ou indefinido), já a Fitch a chama de “alerta de classificação” (RatingAlert) e a S&P de “aviso de crédito” (CreditWatch) - positivo, negativo ou indefinido. Todas essas classificações estão disponibilizadas ao público nos sítios da internet de cada agência, isso reduz a incerteza em relação ao risco dos títulos governamentais.

Os agentes econômicos que utilizam os ratings como reforços na coleta e processamento de informações a respeito dos riscos soberanos, viabilizam as operações com títulos soberanos e mais ainda nos caso de países emergentes. Governos que possuem classificações são mais preferíveis em relação aos que não possuem, uma vez que as classificações são parâmetros fundamentais utilizados por investidores para determinar tomada de decisão de compra e venda de títulos da dívida externa pública. Os grandes investidores institucionais a título de exemplo os fundos de pensão, possuem regras de gestão interna que limitam a detenção de ativos classificados como “grau de especulação”, outros montam suas carteiras de investimento com base nas classificações (propensão ao risco), já os Bancos e instituições financeiras, seguem regras próprias ou legislação financeira de seu país, para determinar provisões e requisitos de capital.

Os investidores consideram os indicadores adequados para administrar a exposição do risco (probabilidade de moratória), as classificações são indicadores de risco relativo e não buscam prever a suspensão de pagamentos. Empresas classificadas como Aa tendem a cumprir no devido termo todas as obrigações contratuais mais frequentemente que empresas com classificações inferiores. Taxas de inadimplência são sensíveis à conjuntura do período em que são calculadas.

Embora fortemente relacionados Risco-soberano e risco-país, apresentam objetos distintos. O risco-país é o risco de inadimplência dos credores residentes em um país associado a fatores que podem estar sob o controle do governo, mas não estão sob o controle das empresas privadas ou dos indivíduos. O risco-país diz respeito a todos os ativos financeiros do país, impondo-lhes uma carga compensatória de prêmio no retorno por eles oferecido. Evidentemente, os dois riscos guardam relação de parentesco, já que uma moratória na dívida soberana tende a exercer impacto negativo sobre os demais fluxos de capital para o país, afetando também dívidas externas privadas. No sentido inverso, sem disponibilidade de divisas o Estado soberano torna-se incapaz de cumprir seus compromissos devidos em moeda estrangeira Como regra geral, a classificação soberana é um teto para os demais credores de um país, mas o teto pode ser ultrapassado em situações especiais, quando as agências entendem que determinados devedores estão menos vulneráveis ao risco de transferência. São cinco os fatores avaliados: i) a probabilidade de moratória generalizada no caso de inadimplência do governo central; ii) valor da dívida, levando-se em conta as garantias; iii) condições de acesso a divisas através da exportação regular e em larga escala, ativos no exterior, proprietário estrangeiro ou outras fontes de apoio externo; iv) integração com as redes de produção global e de suprimento; e v) importância para a economia nacional e para os mercados de capitais internacionais. O indicador de mercado que diz respeito a prêmios de risco em títulos de economias emergentes é o EMBI+ do J.P.Morgan, este índice é composto por uma cesta de títulos principalmente por títulos da dívida externa, mas pode também incluir empréstimos negociados e títulos domésticos denominados em moeda estrangeira de diversos países emergentes e negociados em mercados secundários.

O índice representa uma média ponderada, pelo volume negociado no mercado secundário, dos preços dos papéis que compõem a cesta; a margem soberana é dada pela diferença entre os rendimentos dos títulos governamentais e os títulos do Tesouro dos EUA com características semelhantes, considerados de risco zero (Aaa/AAA, na classificação das agências). O EMBI+ pode ser decomposto em sub-índices, um para cada país. A margem soberana desses sub-índices é usualmente referida como “risco-país”. A remuneração adicional em relação aos títulos do governo dos EUA é dada para compensar o maior risco dos títulos da dívida pública de países emergentes. Quanto maior a margem, maior é a probabilidade de inadimplência inferida pelos investidores. Como no cálculo da margem soberana são considerados apenas títulos emitidos pelos governos centrais, corresponde a um indicador de risco-soberano, sendo algo imprecisa sua denominação como “risco-país”.

O risco-soberano julga não apenas a capacidade de pagar, mas principalmente sua disposição a pagar. O grau de subjetividade na análise, torna mais complexa a avaliação de risco das empresas. A disposição a pagar pode ser bastante reduzida devido à falta de um mecanismo explícito para garantir o cumprimento integral dos termos acordados quando contratada a dívida. Por exemplo, não há uma entidade capaz de resolver as incertezas entre governos e credores, além disso há uma grande dificuldade para credores imporem sanções diretas no caso de inadimplência – Isto decorre do princípio do direito internacional da imunidade dos estados soberanos, segundo o qual as propriedades, tanto físicas quanto financeiras, dos governos não estão sujeitas a jurisdição de um segundo governo estrangeiro. Além disso, as decisões governamentais são tomadas levando-se em consideração não apenas aspectos econômicos e financeiros, mas também sociais e políticos, que podem exercer influência decisiva sobre a disposição a pagar dos soberanos.

Nesses casos o que pode ocorrer são sanções efetivas que os credores impõem como “fechamento do mercado internacional de crédito” (para governos inadimplentes) e “cobrança de um prêmio de risco maior” quando estes voltam a captar recursos no exterior. Esforços para minimizar os eventos de moratória.

Nota: Diante de toda exposição do trabalho a classificação de ratings é um trabalho interdisciplinar que combina a análise por meio de métodos quantitativos com a sensibilidade dos analistas a parâmetros qualitativos, sendo dada grande ênfase a esse segundo aspecto. As três etapas:

i) avaliação de conjuntura,
ii) quantificação dos fatores avaliados, mesmo que qualitativos, por meio de um “modelo de pontuação” e iii) decisão da classificação por votação em um comitê com base na análise das informações levantadas em (i) e (ii).

Fonte: Ministério da Fazenda - Secretaria de Assuntos Internacionais - Temas de Economia Internacional 01.

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